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DIÁLOGO 10

LIVRE COMÉRCIO

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    QUESTÕES AMBIENTAIS E CLIMÁTICAS COMEÇAM A SE TORNAR CADA VEZ MAIS PRESENTES EM ACORDOS COMERCIAIS, COMO O DA UNIÃO EUROPEIA E O MERCOSUL CONCLUÍDO EM JULHO DE 2019.

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Na décima edição da série Diálogos Futuro Sustentável, promovida pelo Instituto Clima e Sociedade (iCS) e a Embaixada da Alemanha no Brasil, especialistas em comércio internacional, representantes de governo e da sociedade civil se reuniram para a possibilidade de convergência de objetivos entre políticas climáticas e acordos comerciais. 

Ter um acordo dessa envergadura - o mais completo e denso já visto - em um momento político muito específico do Brasil, logicamente, trouxe muita controvérsia. Mas os acordos comerciais por si só não são ruins. O comércio é a atividade mais antiga da história. O que nos cabe pensar é que tipo de acordo comercial queremos para que seja compatível com os desafios climáticos que temos.

Ana Toni

Diretora executiva do Instituto Clima e Sociedade (iCS)

Lutz Morgenstern, Primeiro-Secretário para Assuntos Ambientais da Alemanha no Brasil, explicou que por muito tempo as agendas de mudanças climáticas e livre comércio eram vistas como contrárias. Mas, segundo ele, os questionamentos vindos de diferentes atores da sociedade sobre as implicações desse acordo entre Mercosul e União Europeia mostram que esses assuntos não podem ser debatidos isoladamente.

“Diferentes públicos questionam as consequências do acordo para o meio ambiente. Por isso, é preciso haver regras específicas para garantir proteção do meio ambiente e o combate às mudanças climáticas. Assim, é importante promover um amplo debate sobre como essas regras podem ser postas em prática.”

Lutz Morgenstern

Primeiro-Secretário para Assuntos Ambientais da Alemanha no Brasil.

A especialista Cathrin Zengerling, da Universidade Albert-Ludwigs de Freiburg, traçou um panorama de como questões ambientais e de sustentabilidade foram sendo consideradas em acordos comerciais internacionais. Ela explicou que o Acordo de Livre Comércio entre Mercosul e União Europeia dedica seu capítulo 6 à manutenção dos compromissos climáticos do Acordo de Paris e o oitavo capítulo à proteção de florestas, além de mencionar também os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.

Outra inovação do Acordo de Livre Comércio entre Mercosul e União Europeia, segundo Cathrin, é que ele define um prazo para resolução de conflitos e dá o embasamento para solicitação de consultas no caso de não-cumprimento de condicionantes socioambientais e não apenas práticas anticompetitivas, como é o costume nesses acordos comerciais.

“A discussão sobre mudanças climáticas não estava presente na OMC e na liberalização dos regimes de investimentos pelos países. No acordo UE e Mercosul vemos essa integração. Então a existência de capítulos dedicados às mudanças climáticas, a proteção das florestas e a promoção dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável é um progresso. No entanto, a implementação fraca ou ineficaz desses requisitos também é uma preocupação, bem como a possibilidade de perpetuação de um padrão de consumo não-sustentável dentro de processos comerciais por meio deste acordo.”

Cathrin Zengerling

Universidade Albert-Ludwigs de Freiburg

PRÓS E CONTRAS DO LIVRE COMÉRCIO

O livre-comércio é um modelo de mercado que possibilita a livre circulação de mercadorias com reduzidas taxas alfandegárias, como resultado de acordos mútuos entre os países.

Yana Dumaresq, Secretária Especial Adjunta de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais do Ministério da Economia do Brasil, relembrou os benefícios do livre comércio segundo a teoria econômica. Ela explicou que o primeiro grande benefício do livre comércio é a possibilidade de especialização, mediante vantagens comparativas para ganho de escala. Assim, como o comércio é livre, os países podem focar nas áreas em que são mais competitivos. E o segundo grande valor da liberalização comercial é justamente a atualização de tecnologias, de know-how e de padrões.

“A agenda de abertura e inserção no comércio internacional é uma estratégia de convergência do Brasil às melhores práticas internacionais. “Essa agenda tem sim um componente tarifário que leva a um aumento de oferta e de demanda. Mas sobretudo a agenda comercial do século 21 é uma agenda não tarifária. É uma agenda de padrões.”

Yana Dumaresq

Secretária Especial Adjunta de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais do Ministério da Economia do Brasil

Gilson Spanemberg, Fellow Researcher na Global Urban Development (GUD), relatou a sua experiência enquanto trabalhou na Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex). Segundo ele, a agência percebeu que era importante realizar o debate sobre realização de novos negócios em um cenário de transição para uma economia de baixo carbono.

“Percebemos que era necessário capacitar as empresas brasileiras para acessar novos mercados e inserirem seus produtos e serviços em cadeias globais de valor, cumprindo exigências sob o ponto de vista de sustentabilidade que mercados mais avançados já exigem.”

Gilson Spanemberg

Fellow Researcher na Global Urban Development (GUD)

A Costa Rica é um caso bem-sucedido de país que conseguiu diversificar e fazer crescer a sua economia, com benefícios ambientais e sociais, por meio da assinatura de acordos de livre comércio. Na década de 80, em um momento marcado por turbulência na América Central, quando muitos países vizinhos estavam em guerra civil, a Costa Rica, cuja economia até então era predominantemente agrícola, começou a negociar acordos comerciais internacionais. Assim o país conseguiu atrair novos negócios, desenvolvendo clusters industriais de tecnologia, manufatura, serviços digitais e equipamentos médicos. Na década de 80, a agricultura representava 80% da economia do país. Hoje, o setor de serviços representa 50%, a indústria 40% e a economia do conhecimento 10%.

“A Costa Rica é um exemplo de que é possível crescer economicamente e ecologicamente. Nos últimos 20 anos, nossa economia cresceu sete vezes em tamanho e conseguimos dobrar a cobertura vegetal do país, além de alcançar uma matriz energética 99% renovável.”

Alvaro Cedeño Molinari

Representante da Costa Rica junto à Organização Mundial do Comércio (OMC)

DESAFIOS PARA IMPLEMENTAÇÃO

No entanto, o agravamento das mudanças climáticas desafia a agenda de livre comércio, uma vez que os fluxos comerciais internacionais se intensificaram com a globalização. Ela veio acompanhada do aumento de emissões de gases de efeito estufa associado a uma redistribuição da produção e o transporte desses bens em âmbito global. Segundo a Carbon Trust, aproximadamente 25% de todas as emissões de CO2 provenientes de atividades humanas são importadas ou exportados de um país para outro.

Assim, há preocupações de que acordos de livre comércio agravem ainda mais a crise climática, uma vez que podem contribuir com o aumento da demanda por produtos de elevada pegada ambiental e de carbono.

No caso do acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia, carnes, soja, café, bebidas e tabaco estão entre os itens mais comercializados dos países do sul para o norte. Na contramão, a União Europeia vende sobretudo veículos e máquinas, produtos farmacêuticos e químicos e equipamentos de transporte ao Mercosul.

Segundo Sascha Müller-Kraenner, Diretor Executivo e CEO da Deutsche Umwelthilfe, organização de consumidores na Alemanha focadas em temas ambientais, sempre houve uma suposição de que a solução para o bem-estar global e para lidar com a sustentabilidade estaria em um sistema multilateral bem regulamentado baseados em tratados construídos em organizações multilateriais.

“Estamos buscando um sistema global de governança baseado no Estado de Direito. Mas nos últimos anos aumentaram as dúvidas sobre se as prioridades e os interesses que temos nesse sistema são os corretos. Há rachaduras nesse consenso de que o comércio é sempre bom. Muitas perguntas que estão sendo feitas sobre meio ambiente e direitos do consumidor.”

Sascha Müller-Kraenner

Diretor Executivo e CEO da Deutsche Umwelthilfe

Até que ponto aumentar o comércio de grãos e produtos agrícolas, como soja, etanol, carne bovina e derivados do Mercosul com a União Europeia não aumentará as emissões e provocará mais impactos socioambientais? Esse foi o questionamento feito por Maureen Santos, Coordenadora do Programa de Justiça Ambiental e Social da Fundação Heinrich Böll no Brasil.

Ela apresentou dados de um estudo recente da Grain para lançar luz à essa questão. Levando em consideração os atuais volumes de exportação das principais commodities do Mercosul com destino a Europa e a projeção de aumento desses fluxos comerciais com a ratificação do acordo de livre comércio, observa-se um incremento de emissões significativo. Chamam atenção os fluxos comerciais da carne bovina, que segundo as estimativas do estudo, apresentarão um aumento adicional de emissões de 82%. Em relação a exportação de aves, esse incremento de emissões é de 55%.

Maureen destacou ainda a preocupação relativa ao fechamento ou redução dos espaços de atuação da sociedade civil no processo de construção e implementação do acordo comercial entre Mercosul e União Europeia.

“Aqui no Brasil, não tem um espaço formal em que a sociedade civil possa apresentar suas questões nesse debate, diferente do que vem acontecendo em alguns países da Europa, onde se tem um debate público muito mais amplo. É preciso prever espaços de participação para se trazer a transparência necessária não só no processo de construção do acordo, mas na sua própria implementação.”

Maureen Santos

Coordenadora do Programa de Justiça Ambiental e Social da Fundação Heinrich Böll no Brasil

Lutz Morgenstern

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